quinta-feira, 31 de julho de 2008

Da falta de sol...

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Que não haja falta de sol!... Mesmo que seja um Sol de Vidro.
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Ou um Sol de Palha...
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Ou um Sol no Meio da Noite...
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[Parece que é preciso aquecer o sol? Ainda bem, que há quem não desista de o encontrar...]
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. 1 Wilson Ferreira Antunes 2 João costa 3 Ruben de Andrade, Fotos de olhares.com

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Here comes the sun...



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Afinal... não choveu.
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Serão estas mudanças bruscas, que me confundem as sinapses?
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[É doloroso, olhar o sol... assim... de frente!]
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.de Olhares.com, Foto de Ana Rita Dias

Em "standby"...


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Estou em standby, como a natureza... aparentemente, ao sabor do vento e das brisas [ao sabor do tempo e a vê-lo passar...].
Procuro não fazer planos, nem grandes, nem pequenos. Não vale a pena.
Há uns dias atrás, andámos três ou quatro quarteirões e voltei para casa quase cega, para me deitar. [Ontem, tive mais sorte e a saída prolongou-se até ao final do dia.]
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Hoje, se o Osteopata estiver pelo consultório, quem sabe lá irei, sem grande convicção, mas farei o esforço da tentativa.
Não estou com grande paciência para ouvir prelecções acerca do meu estilo de vida… e porque tenho este ar infeliz… e que não posso carregar nos ombros o peso do mundo[que é assim que ele fala, antes de começar a esticar de um lado e a torcer do outro… que se eu prestasse mais atenção ao que ele diz, tiraria mais proveito do que me faz…].
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E eu, incorrigível céptica, aguardo que o senhor se cale, com educação e muito pouca paciência e que comece o trabalho [propriamente, dito…]. De facto, nunca fui ao Osteopata porque me sentia bem, pelo que, seria impossível aparecer com um ar menos infeliz! Mas, não vale a pena perder tempo a explicar estas evidências. Osteopata é como outro médico qualquer. Apanham-nos ali, à mercê, cada um à sua maneira e conjecturam por ali adiante… no mesmo padrão dogmático.
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O mais provável é o senhor nem estar e eu ter que resolver os meus problemas de mobilidade sozinha, esperando que passem, porque passei um ano inteiro a fazer assim e lá me fui acomodando ao passar dos dias e das dores…
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Se tivesse que me levantar cedo para trabalhar, seria certo que me levantaria. E, com queixumes maiores ou menores, estaria no local certo à hora certa, que não teria outro remédio. A coisa poderá parecer mais grave porque estou de férias, seria normal acordar repousada, feliz e contente, à espera de gozar os prazeres de não ter horários e fazer o que me apetece!...
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Este ano de trabalho, que passou, também me esgotou os apetites e já nem sei o significado do que me apetece.
Se me apetecia sol? Nem é tão importante, assim. Esta luminosidade parda, que vejo lá fora [e que poderá transformar-se em chuva, ou em sol aberto, quem sabe?], está muito bem como está… não me faz latejar os olhos… não me obriga a fechar-me aqui dentro… [persianas e cortinas semi-cerradas…].
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É sombrio… é. Mas não destoa! Um sol aberto, agora mesmo, traria a confusão e pouco mais. Assim, pode ser que consiga ler… pode ser que consiga escrever… pode ser que consiga sair um pouco e andar a pé para desentorpecer as pernas… pode ser que as dores de cabeça abrandem e me dêem algum sossego [aquilo que podia fazer, necessariamente, passa pelo apurar da visão e acabo sempre por ter que me sentar…].
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Quanto a saídas do Porto, mais ou menos, estão agendadas. Terei que adaptar os meus ritmos aos de outros e o assunto há-de resolver-se per se.
É como se fosse trabalho… com horários e tarefas e muita gente a circular – e eu no círculo, também. Talvez nem falte a adrenalina… que me é
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[Se era isso, que eu queria? Muito provavelmente… não. Mas, da maneira que me sinto, gastaria as férias a tentar descobrir… e a perder tempo…]
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.Amarante, Foto de Fins de Julho no Carregal

terça-feira, 29 de julho de 2008

Reflexões vegetais...



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Depois de ler o post da MdSol e muito à pressa, porque os olhos latejam, a olhar para a luminosidade do écran... lembrei-me desta buganvília, que floresce na parte mais sombria do exterior do quarto onde fiquei, nesta minha breve saída.
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Na altura, não lhe prestei grande atenção... nem às ervas de cheiro, que cresciam em frente, num canteiro muito bem tratado...
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Pelos vistos, tanta oxigenação não me fez bem. Hoje é o segundo dia em que tento resistir à dor de cabeça, que se generaliza pelo corpo todo, sequela de mais uma enxaqueca com alucinações visuais assustadoras... que também não percebo, Mdsol, porque é que resolveram atacar-me, logo agora!...
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Sou eu que pareço um "vegetal"... O corpo recusa-se a reagir. Ontem recusava-se, até, a andar.
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[Se isto continuar assim, tão cedo não me aproximarei de um PC. Dá-me náuseas... Em pé não consigo estar, deitada dou cabo da coluna e sentada, também.]
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Foto de Buganvília, para a MdSol

segunda-feira, 28 de julho de 2008

De certas peregrinações...



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Não chegámos a tempo de ver a exposição que queríamos ter visto. Tinha sido desmontada na semana anterior. Nem percebi como o tempo passou tão depressa...
No Museu Amadeo Souza Cardoso - Museu de Amarante - agora, homenageava-se o último surrealista português, vivo e ainda muito lúcido, nos seus oitenta e tal anos. [Confesso que, pouco tenho a acrescentar ao que vi e, obviamente, não me espantou...]
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O que restava da outra exposição, que eu teria muito mais interesse em ver - Karin Somers o efeito dos dias - pude apreciar no atelier de escultura cerâmica da artista. Perdi a oportunidade de ver as obras num local de culto [felizmente, visiono com alguma facilidade], mas as esculturas estavam bem perto das mãos e do olhar e não foi menos interessante. Gostei imenso do trabalho dela e receberam-nos tão bem que, por alguns poucos dias, esqueci os meus cansaços e nem me lembrei do que era suposto esquecer.
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.Mais um Museu a não perder, não pela actividade [enfim...], mas pela proximidade dos claustros e da Catedral de S. Gonçalo.
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Por lá andei, a espreitar alguns cantos e recantos, cada vez mais afastada dos bulícios de um surrealismo fora de tempo... mas, que talvez faça sentido, num Museu que dá pelo nome de outro pintor [tão maltratado no seu tempo e desencantado a contra-tempo, até em nomes de cafés e lojas da cidade...].
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Curiosamente, descubro algumas coincidências formais... as cruzes e o empedrado... enquanto as vozes e os encontros decorrem, ao longe...
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Desta vez, um ar mais sólido e definitivo do que em Barcelos... Granito e pedra! Marcas de tempos imemoriais... e o meu pé, quase nu, como tantos pés de peregrinos, que por ali passaram...
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[De repente, tão perto das vozes... Alguns passos em volta e nada mais se ouve, a não ser o que não tem som, o silêncio dos claustros... não há palavras... não há ecos... apenas a imensidão daquele Nada... e eu!]
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. Fotos do Museu de Amarante, sábado em finais de Julho

Um post[al] de Amarante...



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Podia ser um postal, trazido de Amarante...
É uma simples foto da cidade, tirada à despedida, tal como a encontrámos: enevoda e cinzenta... encoberta num misterioso véu de quase chuva, que deixámos para trás, para a ver cair... aqui... no Porto.
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[Nem nos aproximámos da parte nova. As minhas memórias de Amarante não o permitiram e não deixei que a cidade me traísse. Sem dar conta, acabei por ser eu o cicerone...]
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sexta-feira, 25 de julho de 2008

Narcisos são flores de que não gosto...


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Os narcisos têm um cheiro que me lembra câmaras e ante-camâras de velórios.
Nunca gostei destas flores... Não lhes reconheço perfume, nem encanto.
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São enjoativas, como as dores do corpo. Assinalam bem a morte: como a sua metáfora.
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Hoje, há sinais de chuva, num Verão que não prometia nada...
Esta manhã, que termina, podia ser mais uma tarde de Janeiro [não fosse este ar abafado, que permaneceu no interior das casas].
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O que se faz numa tarde de Janeiro, em férias de um suposto Verão? O que se faz quando o corpo dói em cada pequena articulação e só apetece agarrá-lo, qual Narciso [finalmente, desenganado...] e esperar que passe?
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[Se fosse mais velha e não me chamasse pelo meu nome, estaria sentada no sofá, a fazer crochet? ... ?]
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Foto de um corpo só
cedida por João Carqueijeiro

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Carimbos e marcas que o tempo levou…


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Aqui há uns anos, depois de uma empreitada valente, às voltas com uma tese de mestrado e um orientador sempre ausente [que, em altura crucial, de defesa de tese, se deu ao luxo de desaparecer, para o Brasil, ou parte incerta da América do Sul, numa sabática escandalosa, que nos fez esperar, a todos, cerca de um ano…], o início das minhas férias foi passado aqui em casa, na oficina ao fundo do jardim…
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Soube-me muito melhor do que uma viagem… sei lá aonde!...
Aproveitei umas experiências do mestre e trabalhei ao lado… Ensaiavam-se óxidos sobre azulejos [mais tarde, vidrados…]. Sem pressas. Com calma, para variar. O silêncio não era preciso ensaiar… Larguei a escrita académica... Deixei de pensar em orientadores que nos arrebanham para nos desorientarem… e descansei.
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Hoje, mesmo que quisesse repetir as mesmas proezas: pintar azulejos em silêncio e defender uma tese de mestrado sozinha… acho que não seria capaz.
Nessa altura, ainda as enxaquecas e os seus efeitos devastadores, do dia seguinte, não aconteciam numa base tão regular… [Nessa altura, ainda tinha não sei o quê, que me faz falta... agora... e, que prefiro nem indagar, para não me assustar.]
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O passeio de ontem, felizmente, não era o início de uma saída por vários dias, ou não teria conseguido deitar-me e descansar, depois de mais uma enxaqueca. Hoje, não estaria sentada, com outro analgésico menor, a tentar mexer-me o mínimo possível, para não alterar a posição das cervicais…
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Por muito que quisesse deslocar-me até à oficina, ao fundo do mesmo jardim [que mudou bastante, pelas nossas póprias mãos, nos últimos anos…], não seria capaz de baixar a cabeça e de fixar o olhar, sem sentir dor.
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Andei a vasculhar umas fotos antigas e descobri estes carimbos [foi assim que lhes chamei, numa primeira fase, só com óxidos…], que já nem tenho. Ofereci-os. Tudo me leva a pensar que foram os primeiros, na sua simplicidade monocromática...
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[Só hoje, os apreciei, realmente. Não… nunca tinha pintado com óxidos sobre azulejo. E sim… há toda uma série de experiências que comecei e nunca tiveram continuidade. Porque o tempo é assim mesmo… nem sempre se oferece, no momento certo… nem sempre se dá incondicional… a maior partes das vezes, apresenta-se como um contratempo… ou a contra-tempo, como hoje. De castigo, fiquei sozinha em casa, à espera de melhor tempo…]
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Fotos de azulejos pintados com óxidos e esgrafitados

segunda-feira, 21 de julho de 2008

No Átrio do Museu...






 
Fotos do Museu de Olaria em Barcelos, átrio a céu aberto

Dos sopros e dos sons...


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No sábado passado, saímos do Porto, para mais uma exposição, daquelas a que eu não posso faltar…
Esta aconteceu no Museu de Olaria, em Barcelos, naquele espaço único, em que o interior está a céu aberto e as obras convivem com os quatro elementos na perfeição [esculturas em material cerâmico… como as que tenho espalhadas pelo meu jardim urbano, há anos!...].
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No meio uma cruz… quatro quadrados de ripas de madeira [agora, envelhecidas pelos oito anos que passaram, desde que ajudei a montar a outra exposição, Esculturas no Átrio…] quatro quadrados de seixos do rio… e as obras, que mais vale serem apreciadas in situ e não aqui!...
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Desta vez, houve um recital de oboé… tocado por um rapaz muito jovem, que contava histórias antes de tocar as peças. Novo, mas um virtuoso!... Explicou as diferenças entre os vários instrumentos que se incluem na tipologia do oboé. [Quanto a mim, que cheguei a ter um namorado flautista, nunca me tinha ocorrido que o tocador de oboé se chamava oboista!... Não soa beml… ao contrário dos instrumentos de que gosto tanto. É que, também tenho um vizinho que toca oboé… e cada vez melhor!]
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Tudo correu muito bem, desde a exposição ao recital. Depois, sempre gostei do espaço, duplamente, interior e exterior daquele Museu.
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O que me espantou foi chegar a casa [reportagem fotográfica feita, porque a câmara de vídeo já me faz doer os braços, sobretudo, as mãos…] e ter-me lembrado das imagens de filmes de Robert Gardner[como podiam ser de David e Judith MacDougall…].
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Estranho é, continuar a pensar numa África Negra, para onde nunca viajei, onde nunca vivi… Mas, insolitamente, irrompe num recital de oboé, numa exposição de escultura, sem mais nem menos…
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[Faz-me recordar o improvável… e lembra-me de que não existe só no Mapa da Pobreza do Mundo, inexoravelmente… Sinto-A a desejar-me... desculpa vã, para não dizer que sou eu a desejá-lA!... como tantas vezes me acontece… sem nunca saber porquê... África!]
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Nota: Não referi o nome do jovem oboista e estaria em falta, se não o revelasse. Chama-se Samuel Castro Bastos...
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de Robert Gardner, Filmstill do documentário Rivers of Sand

sábado, 19 de julho de 2008

Da continuidade e da repetição...


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As férias estão quase a começar… e ainda tenho alguns assuntos por resolver.
Segunda e terça-feira, farei mais umas viagens… ir e voltar… ir e voltar…
Se este ano foi difícil, o próximo não será muito pior?
Há uma vantagem, todos me dizem [se é que pode ser considerada uma vantagem…], posso contar com a segurança da continuidade. Calo-me. Faço um silêncio, que me custa desvendar. A continuidade implica voltar a estar com as mesmas pessoas, que anseiam, não sem carinho, pelo nosso regresso… [Ir e voltar… ir e voltar…]
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Porque, o meu receio, nesta história da continuidade, é a repetição.
Ao contrário de muitas pessoas que conheço, eu temo as repetições. [Como o tempo dos relógios...]
O conforto do que já é conhecido não me conforta. Assusta-me. Sempre foi assim. Não gosto de repetir os passos que dei. Reajo mal ao déjà vu. [Em pequena, chamavam-lhe tédio, agora, nem sei como designar tal mania… e esta coisa das manias, tende a exacerbar-se com a idade.]
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Por isso, as rotinas me cansam… por isso, tento mudá-las, constantemente. Diria que, compulsivamente. Insisto em ver mudanças na paisagem, que passariam despercebidas à maior parte de quem passa… Insisto! E chamam-lhe atenção...
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E há rotinas impossíveis de mudar. Os horários, as mesmas salas… os mesmos rostos…
Por isso, também, procuro sinais que outros não precisarão de ver… os alunos e as alunas crescem!... As aulas não são dadas da mesma forma [e a uniformização que se anuncia já me constrange…], as matérias mudam, de um ano para o outro… Anseio que as pessoas mudem, também!... E chamam-lhe renovação...
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Não gosto de planear viagens. Custa-me fazer malas para as desfazer no destino. Mas, o que me custa, é arrumá-las para as trazer na chegada e voltar tudo ao mesmo!...
Nos regressos, procuro mudar o sítio dos objectos mais significativos, mais necessários e que são cada vez menos… E chamam-lhe insatisfação...
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[Por isso, escrevo. Não importa sobre o que escrevo. Escrevo. Procuro significados, à minha volta, para lá das continuidades. Procuro desfazer rotinas… Procuro as suas pontas soltas. Encontro, amiúde, o que me magoa e magoa os outros. Procuro e canso-me. Nem sempre encontro o que procuro. Nem sempre o que procuro é bonito de se ver… e nem sei a razão mais profunda dessa procura, que me acompanha, desde que me reconheço... insatisfeita... se assim o quiserem. ]
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Foto de www.olhares.com, rosto em movimento de Inês Nunes

terça-feira, 15 de julho de 2008

Do nome da rosa...


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Hoje, resolvi esquecer-me do tempo, das horas, dos minutos e dos segundos.
Talvez, porque tenha acordado com os compromissos dos outros e descobri que não tinha nenhum! [Terei muitos… mas, por hora não.]
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Não tive sono, não me lembro de ter sonhado…
Também não senti vontades especiais. [E, ainda bem, o calor teria dado cabo de mim, caso me decidisse por aventuras fora de portas…]Mas, saí. Por pouco tempo.
Não. Não fui andar a pé para manter a forma [aquilo que o meu pai chamaria, de passeio higiénico, numa linguagem tão fora de moda, como o meu próprio pai…].
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Cruzei-me com a minha velha conhecida sem abrigo. Uma memória viva, desde o primeiro dia em que vim morar para o Marquês e resolvi fazer uma prospecção pela zona. [Aliás, passeio de que ainda hoje me recordo… o Marquês era um microcosmos, onde se podia encontrar tudo… tal como a encontrei a ela.]
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Tinha deixado as suas coisas, displicentemente, como de costume, perto da confeitaria onde vou comprar pão [quando sou eu que vou comprar pão!]. Chamaram-me a atenção uns sapatos em tons de rosa, com pedrinhas coloridas e um ligeiro tacão. Contrastavam com o aspecto cada vez mais masculino, que o tempo foi revelando e ajudando a consolidar.
Fiquei parada, a olhá-los e a vê-la, ao longe, mais calma hoje, do que nos outros dias. Pensei… Espero que não lhos roubem!
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Nos últimos tempos, tem gestos muito repetitivos, de quem tenta arrancar a pele. Parasitas, sujidade, podia ser. Parece-me que não é. Ou não é só… Nunca andou acompanhada. Dantes falava sozinha. Agora, já não fala. Também nunca a senti agressiva.
Agora, apenas, sorri… Um sorriso estranho, que não se dirige a ninguém. [Já se dirigiu a mim, há muitos anos atrás… quando eu tinha a sensação de que só me via a mim.]
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Esta mulher faz parte dos meus dias. Apesar da pele curtida, pelo frio e pelo calor, deve ter a minha idade. E o que é mais bizarro, que me custa a admitir, naquele não diagnosticado e provável autismo, é que parece feliz… Há dias em que irradia uma imensa felicidade, que me constrange. Como me constrange, quando a vejo a tentar arrancar-se de si própria.
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Das poucas compras que fiz, nada lhe seria útil. Enquanto contornei mais um quarteirão, para me proteger do sol e andar pela sombra, pensei nisso.
Nada do que vinha nos sacos de plástico lhe faria falta, na devastadora liberdade de quem não tem que tratar de um corpo, de um filho, de uma casa, de um quotidiano. Talvez os sacos de plástico… apenas.
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[Lembrei-me do romance de Umberto Eco: também eu, nunca conheci o Nome da Rosa…]
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.em www.olhares.com de M. Rosário António, foto de uma rosa

À procura de um Arlequim...


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Cheguei a casa no pico do calor. Desfeita. Não consigo suar, como as outras pessoas… [Sinto, apenas, um calor desmesurado.].
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Estranhei o excesso de trânsito na cidade. Notava-se a impaciência dos condutores e dos peões, debaixo de sol, a ousarem movimentações perigosas, em busca da sombra, na ânsia de chegar.
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Depois de ter dormido muito pouco, com receio de não ouvir o despertador e chegar atrasada à primeira vigilância, desta 2ª fase de exames, tanto calor parecia a continuação de um sono que não dormi e de sonhos que sonhei.
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Afinal, fui a primeira a chegar, ainda não eram oito horas da manhã, nos únicos momentos de frescura do dia. Conseguimos manter a sala com uma temperatura suportável, de porta aberta, as luzes dos corredores apagadas… tudo muito sombrio e silencioso.
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A chegada foi para molhar o corpo com água quase fria, sem me secar muito… e levantar as pernas cansadas, das duas horas e meia em pé e do sol abrasador da viagem. Não dei conta de ter adormecido no sofá…
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Devo ter dormido um sono longo e leve, porque sonhei sonhos sobrepostos e difíceis de perceber. Acho que nem tentei!
É que, acordei com uma estranha vontade de procurar um desenho antigo, incapaz de escrever, sem conseguir articular frases e palavras. [Uma pena, devo ter pensado, já que tempo, não me faltaria…]
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Um Arlequim!... Lembrei-me de ter desenhado um Arlequim. Demorei, mas encontrei. Terei sonhado com Arlequins?
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[Continuo sem ter vontade de tentar perceber os sonhos que sonhei. Muito menos, consigo entender esta compulsão por um Arlequim quase esquecido, mero exercício, desenhado e pintado em papel transparente. Há coisas que talvez não valha a pena tentar perceber… sendo melhor… deixá-las… acontecer... quando há tempo!...]
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.Arlequim s/data, Desenho digitalizado de um ar de

sábado, 12 de julho de 2008

Um ar de música...



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O meu filho saiu, cedo. Mais um exame.
O meu jovem vizinho ainda não acordou, para me presentear com os seus exercícios no piano.
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Nestes anos, nesta casa, começou por ser o som irritante das escalas repetidas, vezes sem conta, hesitantes e desastradas… com pequenos trechos simples… até se ouvirem peças inteiras, cada vez mais seguras e soltas.
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Ao mesmo tempo, o meu filho agarrava-se à guitarra eléctrica e fazia o mesmo. Foi melhorando, começou a compor. E a rua aguentou os primeiros passos destes jovens talentosos e promissores. [Só o vizinho se dedicou, a tempo inteiro, à música… ]
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Com as janelas abertas, para o Verão, a música ouve-se, mais nítida. Também deve estar em época de exames, no Conservatório, provavelmente.
Dou comigo a pensar que foi bom ter tido a paciência de esperar.
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Acho que sei, porque penso ser um jovem vizinho e não uma jovem vizinha. [Nunca o vi. Só o ouço. Mora no alinhamento da minha casa…]Num dos prédios das traseiras, viveu um grupo de raparigas que se dedicava ao Belo Canto. Nesta altura do ano, vinham para a varanda exercitar os seus trinados… e o piano parava… e elas riam e voltavam para dentro, no final. Depois, o piano respondia. Convenci-me, assim, que era um rapaz.
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Mas, as raparigas mudaram-se e o meu vizinho continuou a tocar no seu piano. Faz-me companhia em muitas tardes. Sinto-lhe a falta quando não está.
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Houve dias em que chegámos a bater-lhes palmas… pela evolução, pela persistência…
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[Aguardo que acorde e recomece. Que obras irei ter o prazer de ouvir? De repente, lembro-me do exame do meu filho… Talvez esteja, também, a prestar provas, nesta manhã de sábado. Que lhes corram bem!...]
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de António José Sousa de Almeida, Foto de www.olhares.com

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Dos campos de milho [2]...


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Por vezes, encontro campos onde o milho já vai mais alto... onde as espigas não hão-de tardar a ser colhidas...
[E era aqui, que este post terminava.]
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Depois do comentário da Marta, resolvi voltar, por me parecer incompleto...
Sinto alguma nostalgia das viagens, quase diárias. Há que dizê-lo. Apesar de estar mais que consciente da distância percorrida, dos custos que comporta, da poluição que produz, gosto de conduzir sozinha. Foram momentos que me souberam bem.
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Talvez, por isso, tenha inundado este sítio de campos de milho!... Inesperadamente, não tenho serviço marcado na Escola. Não é tão perto, que me decida a ir lá, verificar o calendário. Tenho colegas prestáveis, que fazem o favor de me manter informada... para poder, mais tranquilamente, arrumar a desordem que ainda reina por esta mesa e nestas estantes [até porque, será pouco tempo, há que aproveitá-lo...].
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Como tal, praticamente, não tenho saído de casa. A arrumação demora mais do que o previsto. Detenho-me em pormenores. Atentamente, leio documentação do início do ano... alguma, recuso-me a deitar fora. Depois, hesito quanto ao lugar onde devo arquivá-la, para não me esquecer [sabendo, de antemão, que nestas arrumações, muito ordenadas, não me lembrarei do fio condutor que as conduziu...].
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[Ao pé destes campos de milho, a minha sala está um caos. Consola-me olhar para eles e sentir a ordem das filas dos pés de milho.]
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de José Marques Lopes, Foto de www.olhares.com

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Dos campos de milho [1]...



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Está quase na hora de ver as espigas de milho, dos campos por onde costumo passar.
Como vou a conduzir, na A28, é impossível parar para fotografar a paisagem.
Pedi emprestado este campo de milho, assim…
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Não é menos verde. Não será tão diferente.
Consegui ver estes campos nas quatro estações. Foram o cenário de muitas madrugadas ensonadas, que me ajudaram a despertar. Mesmo debaixo de chuva forte, de neblinas turvas, de luz e sombra… ajudaram-me a acordar para um novo dia. Fizeram-me esquecer alguns dissabores de muitas vésperas. Atenuaram o sabor amargo do recordar.
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Hoje, são campos de milho que desejo eternizar [assim como os braços e as mãos e os rostos, daqueles que não consegui ver, porque trabalhamos a contra-tempo…].
Quando, numa ou na outra direcção, era de noite e as luzes da estrada iluminavam o caminho, estavam lá, batidos pelo vento, fustigados pela chuva, numa penumbra cega e negra.
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Nunca hei-de parar, na A28, para entrar num campo de milho…
Nunca hei-de sentir a frescura da sombra dos delicados troncos verdes, que anunciavam as espigas, como em tempos idos, quando a minha avó me levava e me contava histórias, ou seguíamos mudas, debaixo do calor de Setembro, até chegarmos… [nunca fiz perguntas sobre o destino dessas nossas caminhadas].
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[Durante alguns anos da minha infância, julguei que todos os campos de milho eram da minha avó! E que, por entre todos os pés de milho, cresciam feijoeiros... Deixava-me colher e guardar as vagens num cesto de vime. E regressávamos…]
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de Paulo Martins, Foto de www.olhares.com

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Uma tarde de domingo...


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Está sempre vento nas praias do Atlântico…
Caminho enregelada.
Às vezes, sinto mais frio no Verão do que no Inverno. Vou preparada para o sol e a nortada ecoa nos ouvidos, entra pelas roupas, gela os joelhos. Foi sempre assim. Não será da idade.
A minha avó dizia que o vento faz mal aos loucos!... [Penso nisso, sempre.].
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Hoje, acordei assim, encolhida de frio…
Saíram todos, para os seus afazeres e continuei a dormir, sem dar grande conta, fazendo entrar nos sonhos os pequenos barulhos matinais que tentaram abafar.
Aos poucos, começo a conseguir dormir mais... Aos poucos, o corpo parece esquecer-se das madrugadas e acorda, sem o despertador.
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Aos poucos, começo a ter outras vontades [apesar de ainda ser prematuro]. Escrevem-se outras escritas… Desejam-se outros lugares… Deseja-se…
Há tentativas de passeios. Há saídas para comprar pequenas coisas [que não compro, porque tudo me parece igual e redundante e as grandes coisas já não sei o que são e não haveria dinheiro que as comprasse, certamente].
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E volto, com as mãos cheias de inquietudes. Penso nos breves encontros e em breves palavras, que se trocam com desconhecidos. Como é relativa a dimensão das coisas!... São pequenas histórias que prometem vidas inteiras, que ficam por contar. [Ainda me tratam por menina, embora lhes reconheça a vizinhança da minha idade, apesar de carregados de rugas e cansaços, bem mais visíveis, que me fazem pensar como o tempo é cínico e, também ele, marca as diferenças.]
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Enquanto passeio por entre os pescadores de domingo, no molhe, admiro a paciência da espera. Quando um peixe pica o anzol, nas águas poluídas, que se confundem com a foz do Douro, para que serve? São peixes com colorações estranhas e doentias. Pergunto se os comem, a medo. Sorriem… [acharia que não, mas temo que sim…].
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[Afasto-me. Está maré-cheia. As ondas batem com força nas rochas e no molhe. Sentem-se salpicos na aragem, Melhor fora suspender a respiração. Ainda olho para trás. Outro peixe picou o anzol. Deixo-os com a tarde de domingo e um adeus… Aqueço-me no carro a caminho de casa.]
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sábado, 5 de julho de 2008

Em suspensão...



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.Artifícios das imagens [o ponto de vista, apenas]... colocam-me em suspensão.
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Será que teria os pés assentes no chão? Insisto em pensar que sim.
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[Metáfora dos meus dias? Andarei demasiado ocupada com os meus trabalhos e distraída de coisas maiores? Quando parar, talvez saiba responder.]
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quinta-feira, 3 de julho de 2008

Breve intervalo no interregno...


Porque sei que te sentes encostada à bagagem da cidade, tão só.

Porque sei que a tua pele, a descoberto, não arrefece o abrigo onde lentamente padeces de solidão.

Assim, ofereço-te esta meia dúzia de prumos, duas finas folhas de dedos para fazeres com elas, um íntimo diário.

Agora, começa a anotar, o que amanhã docemente apagarás...
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"Uma legenda minimalista", de Bruno Silva

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Hoje fiquei por casa, a trabalhar. São tarefas que exigem espalhar tudo, para tudo agregar. Relatórios finais. Documentos para separar e conferir. Alguma ordem no caos [espero que, este último, seja aparente].
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Resolvi aceitar esta dádiva do autor da foto. Infelizmente, não escreverei para, docemente apagar, porque não se trata de um diário íntimo.
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O cenário minimalista da imagem apelaria para outras escritas. Paciência. O dia também está cinzento, num mês de Julho que prometeria outras cores. Aproveito a calma da tonalidade, para ir riscando mais umas etapas. Faço vistos em cada uma que finaliza. Outras se seguem. Nada parece acabar.
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[Os dias de férias continuam a ser um cenário longínquo, embora o tempo passe.]
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Bruno Silva, Foto de www.olhares.com